Protesto trabalhista em Leningrado em 1967; em março desse ano foram instituídos dois dias de folga semanais pela primeira vez na história do país.
B.Manushin/RIA NôvostiNa atualidade, a semana de trabalho na Rússia e em muitos outros países é regulada por leis trabalhistas que instituem sua duração. Na maior parte do mundo civilizado, ela é composta por cerca de 40 horas semanais.
Mas nem sempre foi assim. No território russo, a jornada semanal de trabalho com dois dias de folga surgiu há apenas 50 anos.
Em 7 de março de 1967, o Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética e o Conselho Central das Uniões Profissionais aprovaram a resolução “Sobre a mudança de instituições, organizações e empresas de trabalhadores e servidores a uma jornada semanal de trabalho de cinco dias, com dois dias livres”.
Uma semana depois, a Presidência do Conselho Supremo da URSS publicou o respectivo decreto.
Pós-servidão
Após a abolição da servidão, que deu início à formação do capitalismo no país, os camponeses eram empregados exercendo todas as funções, da tecelagem dos tradicionais sapatos de fibra e construção de carroças a trabalhos com cerâmica e processamento de linho. Então, não se falava de quaisquer normas na jornada de trabalho.
No inverno, os camponeses praticamente não trabalhavam. No verão, levantavam com a alvorada e trabalhavam até o poente - considerando-se que os invernos no hemisfério norte são bem mais longos que no sul, com o sol se pondo, por vezes, após as 22h ou até depois, e nascendo bem mais cedo.
A população camponesa estava, em sua maior parte, ocupada nas plantações, das quais se ocupavam também aos domingos – já que o trigo podia ser esmigalhado pela ação do sol.
No início dos anos 1930, governo soviético criou jornada de cinco dias (quatro de trabalho e um de descanso) que confundiu tanto o calendário que foi preciso dividir trabalhadores por cores. / Imagem: Wikipedia.org
Mas no domingo também se fazia o dia de descanso, quando os camponeses iam à igreja e depois se dividiam: alguns iam às tavernas, outros, para casa.
Nas cidades, a situação não era muito melhor. Os trabalhadores estavam sempre ocupados nas fábricas por 14 a 16 horas por dia.
Apenas em 1897 foi passada a lei “Sobre a duração e distribuição do horário de trabalho nas instituições de produção fabril e industrial”, que estabeleceu o dia de trabalho em 11,5 horas para homens e 10 horas para mulheres.
O domingo era dia de descanso. Mas ainda se podia acordar a inserção de horas extras e, por isso, na prática a jornada de trabalho não mudou.
Semana de seis dias e bagunça no calendário
Mudanças significativas ocorreram apenas após a Revolução de Outubro de 1917.
Então, o Conselho dos Comissários do Povo (a partir de 1946, Conselho de Ministros), publicou um decreto segundo o qual a jornada de trabalho não deveria ultrapassar oito horas diárias e 48 horas semanais.
A semana de trabalho, porém, continuou a ter seis dias.
Mais adiante, o governo soviético começou a fazer experiências com os horários de trabalho. A partir de 1929, a semana de trabalho foi reduzida a 42 horas, com sete horas diárias.
Depois, a jornada semanal passou a ter cinco dias: quatro de trabalho, um de descanso. Isso confundia as pessoas, já que a semana em geral continuava a ter sete dias, mas a de trabalho, cinco.
Todos os trabalhadores foram divididos em cinco grupos, cujos dias de descanso eram destacados em diferentes cores no calendário. Isso permitiu ao governo organizar uma produção contínua, mas era desconfortável aos trabalhadores: os dias de descanso nem sempre coincidiam com os dos outros membros da família e amigos, o que atrapalhava a vida pessoal e social.
A partir de 1931, os comissariados do povo e outras instituições trabalhavam em semanas de seis dias e folgavam no 6°, 12°, 18°, 24° e 30° dias de cada mês, além do dia 1 de março - já que fevereiro nunca tem 30 dias.
Cancelamento geral das folgas
Quando se iniciou a Grande Guerra Pátria, ou seja, a importante participação russa na Segunda Guerra Mundial, todos os feriados e dias de descanso foram cancelados.
As pessoas trabalhavam sete dias por semana e, apenas em 5 de março de 1944, surgiu um decreto sobre a permissão de que adolescentes menores de 16 anos tivessem um dia por semana de folga e férias.
A jornada de trabalho voltou às semanas de seis dias - um de folga - com sete horas diárias apenas em 1960.
E ainda foram necessários sete anos para se resolver dar aos cidadãos um dia a mais de folga.
Um bilionário e suas intenções
Em 1960, a ideia de uma jornada semanal de 40 horas tornou-se realidade também na maior parte dos países europeus. Esse processo foi possível, em grande parte, devido ao progresso econômico e tecnológico que aumentaram a porção de mulheres assalariadas, e não apenas exercendo os afazeres domésticos, à queda da natalidade, que tornou menores os gastos nas crianças, e, claro, à luta dos sindicatos e partidos trabalhadores pela melhoria das condições de trabalho – basta lembrar da greve da fábrica têxtil Morôzov, em 1885, que contou com a participação de quase oito mil trabalhadores.
Em 1930, o economista inglês John Maynard Keynes previu que, no futuro, a semana de trabalho teria 15 horas.
Infelizmente, sua previsão não se realizou: a semana de trabalho mais curta no mundo hoje está na Holanda, onde os cidadãos realizam, em média, 29 horas em quatro dias úteis e decansam por três. Os maiores workaholics hoje são os japonses e os coreanos, que passam cerca de 55 horas por semana no trabalho.
Na Rússia, a última reforma na lei que regula a jornada de trabalho foi feita em 1991, com a lei da República Socialista Federativa Soviética da Rússia “Sobre o aumento das garantias sociais para os trabalhadores”. De acordo com essa, a duração da jornada semanal não pode ultrapassar 40 horas.
Em 2010, o bilionário russo Mikhail Prôkhorov sugeriu que se introduzisse uma jornada semanal de 60 horas. Isso gerou uma reação muito negativa por parte dos sindicatos, e o vice-presidente do Comitê Para Trabalho e Políticas Sociais da Duma (câmara dos deputados na Rússia), Oleg Shein, classificou uma emenda desse tipo como anticonstitucional.
Mais tarde, Prôkhorov explicou que se referia apenas à possibilidade de o trabalhador complementar a carga com mais 20 horas adicionais. Mas a sugestão, que permitiria aos empresários não pagarem horas extras, não foi bem recebida.
Originalmente publicado pelo portal Gazeta.Ru.
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