Hipopótamo do zoológico de Kaliningrado.
Zoológico de KaliningradoO Zoológico de Kaliningrado tem um mascote: o hipopótamo. E conhecendo a história dos hipopótamos locais, ninguém discutiria isso. Primeiro, um hipopótamo dali sobreviveu à Segunda Guerra Mundial (e havia apenas quatro desses animais no zoológico). Depois, um hipopótamo local deu à luz 25 filhotes, abastecendo de hipopótamos quase todos os zoológicos da União Soviética (sendo, por isso, oficialmente aceito na Associação das Grandes Mães da região de Kaliningrado).
Mas os hipopótamos de Kaliningrado tiveram dificuldades: dois deles - Hans e Gliãsik - passaram por um drama de novela!
Hans, salvo pela vodca
Foto de Hans antes da guerra.
Domínio públicoHans foi o primeiro hipopótamo visto pelos colonos soviéticos na região de Kaliningrado. Quando o exército soviético capturou, em 1945, Koenigsberg (como a cidade se chamava em alemão), encontraram apenas três animais sobreviventes nas ruínas de um jardim zoológico prussiano: um veado, um texugo e um burro.
Mas, um pouco mais tarde, em uma mata de arbustos, eles se depararam com um hipopótamo feroz e exausto de 18 anos, que inicialmente pensaram ser um porco muito grande.
Assustado com o som dos bombardeios, o hipopótamo rompeu a cerca e se refugiou no jardim. Lá ele passou duas semanas sem comida ou água, com sete ferimentos de bala.
Depois de descobrirem o "enorme porco", os soldados estavam prestes a atirar nele, mas a notícia chegou acidentalmente ao Coronel Vassíli Teslin. Ele, então, correu para o general, dizendo: "Não é um porco, é um hipopótamo, um animal muito raro! Restam apenas seis deles na Europa e este é o maior, o famoso hipopótamo Hans! Que horror! Seus vândalos! Ele vale milhões! É um tesouro nacional!"
Hans.
Domínio públicoE, assim, o hipopótamo Hans foi salvo de ser baleado. Mas como tratá-lo? O coronel começou a procurar um médico. Ele se lembraria depois: "Liguei para uma unidade militar e eles riram de mim. (...) Liguei para outra, e eles também eram brincalhões ali. Ligue para a África, me disseram.”
Ele só foi achar ajuda através de um anúncio que distribuiu por toda a cidade. Foi um assustado paramédico alemão que examinou o animal e prescreveu: "Dois litros de álcool por balde de leite. Duas vezes ao dia". O médico não tratou Hans, no entanto, pois tinha início de septicemia. O hipopótamo foi inicialmente cuidado pelos mesmos soldados que estavam prestes a atirar nele.
"Um soldado segurava o maxilar superior do hipopótamo, o outro segurava o inferior, e o terceiro derramava a mistura do balde na boca do hipopótamo gritando: ‘Vamos, camarada, beba cem gramas’!”, lembrava Teslin.
Mais tarde Hans foi enviado um zootecnista de verdade, Vladímir Polônski, que escreveu o seguinte: "Primeiro, lhe demos com água. Em seguida, tentamos lhe dar leite. Depois disso, lhe dei beterraba. O hipopótamo começou a comer. Mas depois de 3 dias, passou a recusar."
Polônski com Hans nos anos 1940.
Arquivo Estatal da região de KaliningradoEntão, Polônski começou a agir de acordo com o esquema testado anteriormente - alimentar o animal com vodca. E deu certo: Hans só conseguia comer normalmente depois de beber.
O médico descreveu sua difícil e tragicômica história de cuidar do hipopótamo em um relatório detalhado: "Eu lhe dei quatro litros [de vodca]. Depois disso, o hipopótamo começou a implorar por comida. Eu lhe dei primeiro um lavagem (4 baldes de água destilada). Depois, comecei a alimentá-lo. O hipopótamo tentou sair, mas como estava bêbado, caiu.”
Depois disso, o hipopótamo começou a comer, mas não melhorou: "Coloquei uma segunda lavagem (4 baldes de água destilada). O hipopótamo começou a se recuperar. Já se passaram duas semanas. O hipopótamo está comendo pouco. Decidi dar 4 litros de vodca. O hipopótamo começou a comer, aí sim! Mas voltou a constipação. Coloquei mais lavagem (4 baldes de água destilada.). O hipopótamo está se recuperando, mas não está comendo bem. Decidi dar vodca (4 litros). E o hipopótamo começou a comer bem. Houve alguns dias ruins. Eu dei um jeito mudando os alimentos.”
No total, Hans foi tratado com vodca por quase dois meses até estar totalmente recuperado. "Agora estou fazendo o treinamento do hipopótamo: o levo pra passear pelo parque etc.", arrematava Polônski.
Gliásik e seu dente
A segunda história aconteceu com o hipopótamo Gliásik e envolveu a participação do Serviço Estatal de Controle de Drogas, funcionários da alfândega, o prefeito, jornalistas e o partido governista. Tudo por causa de um dente.
A hipopótamo Mary, recordista em dar à luz.
Igor Zarembo/SputnikGliásik, um dos filhos da hipopótamo Mary (aquela que deu à luz muitos filhotes e que também se tornou o hipopótamo mais velho da Europa, morrendo aos 56 anos, em 2013), estava sofrendo havia mais de um ano: uma de suas presas tinha crescido mal, ferindo sua bochecha. O hipopótamo não deixava ninguém tocar em seu dente, com enorme dor. O dente tinha que ser extraído urgentemente.
Hipopótamo do zoológico de Kaliningrado.
Vladímir Astapkóvitch/Sputnik"No início, tentamos serrar os dentes de Gliásik ao vivo, o amarramos com cordas, mas, assim que iniciamos a operação, ele rasgou as cordas e quase engoliu nosso veterinário", disse um funcionário do zoológico.
“O hipopótamo é considerado o animal mais perigoso. É uma montanha de três toneladas de músculo. Se ficar com raiva, pode perfurar uma parede de concreto. Isso é assustador. Sabe, ainda quero morrer na minha cama", completou o funcionário.
Gliásik e sua esposa, Mila.
Vitáli Nevar/TASSMikael Bar, um professor veterinário da Alemanha, ofereceu-se para serrar o dente do hipopótamo de graça, mas não conseguiu levar o anestésico necessário para a Rússia, devido à falta de certificação. Além disso, importar qualquer volume do medicamento “Imubilon” na Rússia é o equivalente a transportar narcóticos.
O animal de três toneladas, além disso, precisaria de uma quantidade muito grande da droga: cerca de meio litro. A pena por contrabando de tais quantidades é de até 20 anos de prisão. As clínicas veterinárias locais não conseguiram encontrar alternativas ao medicamento necessário, e os funcionários da alfândega não estavam prontos para assumir a responsabilidade e deixar o carregamento passar. Assim, não foi tão fácil contrabandear outras drogas para Kaliningrado através das fronteiras.
Gliásik.
Zoológico de KaliningradoA situação se arrastava. E, enquanto a questão do dente do hipopótamo era discretamente discutida entre a administração do zoológico e as autoridades, o dente furou a bochecha do pobre animal.
A história tornou-se pública quase por acaso: em 2011, quando jornalistas da revista “Russki reportior”, sediada em Moscou, chegaram à cidade com um projeto de treinamento para jornalistas e estudantes, eles foram "em busca de notícias" no zoológico local. Ali souberam da história de Gliásik e descobriram sobre seu sofrimento: foi como o processo seguiu adiante.
Gliásik.
Zoológico de KaliningradoFuncionários públicos passaram a visitar o hipopótamo, o governador prometeu no Twitter ajudar o animal, e o prefeito disse que obteria a quantidade necessária da droga. O hipopótamo começou a se transformar em um projeto de relações públicas políticas, e havia piadas de que logo ingressaria para o partido governante, o Edinaia Rossia (em português, “Rússia Unida”).
No final das contas, a publicidade desempenhou papel fundamental na resolução do problema. O medicamento anestésico chegou e o dente foi serrado. Gliásik, agora com 31 anos, ainda vive no zoológico de Kaliningrado com sua esposa, Milla. Ele é saudável e não teve mais dor de dente.
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