Cena do filme 'Stalingrado' (2013), que retrata história semelhante
Fiódor Bondartchuk/Sony Pictures Releasing,Columbia Pictures, 2013O gueto de Minsk era o inferno na terra. De julho de 1941 a outubro de 1943, a cidade soviética, que hoje é a capital da Bielorrússia, foi ocupada pela Alemanha. Ao longo desse período, quase 100 mil judeus foram mortos no local, segundo Leonid Smilovitski, historiador israelense de origem bielorrussa. Mesmo antes de serem assassinados, tinham que viver em condições horríveis, separados do resto da cidade, como se fossem animais em uma jaula, continua Smilovitski.
“Tudo no gueto tinha como propósito nos privar não apenas do senso de dignidade, mas também da forma humana”, lembrou Mikhail Treister, um dos sobreviventes do Holocausto na Bielorrússia. “Fome, frio congelante, trapos, marcas de identificação em nossas costas...comíamos sobretudo bolinhos feitos de cascas de batata. E qualquer violação às regras alemãs resultava no único tipo de punição – a morte”.
A chegada a Minsk
Gueto de Minsk
MAMM/MDF/russiainphotoNão só os judeus soviéticos viviam sob tais condições – os alemães traziam judeus de toda a Europa para o gueto de Minsk (além de outros em Varsóvia, Lviv, Łódź) a fim de dar sequência à infame “Solução Final”. Foi assim que a jovem judia Ilse Stein, com 18 anos na época, foi levada de Frankfurt am Main ao gueto de Minsk em 1942.
Por coincidência, quase na mesma época, um novo capitão chegou ao gueto para servir na administração local. Seu nome era Willi Shultz.
“Ele não era antifascista e lutou bravamente na guerra”, escreveu o jornalista Lev Israelevitch. Anteriormente, Shultz serviu na frente ocidental, mas, depois de ser ferido, acabou sendo transferido para Minsk e encarregado da exploração madeireira. “No entanto, lutar na frente é muito diferente de servir no campo da morte.”
Do encontro ao caso
Willi Schultz e Ilse Stein (a única foto dos dois juntos)
ArquivoTalvez Shultz estivesse insatisfeito com a violência nazista, mas seu encontro com Stein mudou totalmente sua atitude. “Depois do massacre de março de 1942, o governo formou novos coletivos de trabalho, incluindo aqueles que trabalhavam na exploração madeireira, que ficariam encarregados de aquecer o edifício de comando”, escreve Smilovitski. Foi assim que Shultz conheceu Stein.
Uma história de amor no gueto, onde dezenas de pessoas eram mortas todas as noites, seria loucura. Stein admitiu isso para si mesma no documentário “A Judia e o Capitão”: “Sangue corria pelas ruas, era terrível... Se não hoje, nós iríamos morrer amanhã. Era impossível escapar do horror ali”.
No entanto, o mais inusitado ocorreu: o capitão nazista se apaixonou pela judia, e os dois começaram um romance. Não se sabe ao certo se Stein realmente sentia o mesmo que o oficial nazista. Em um artigo intitulado “Destino de Ilse Stein”, seu neto, Roman Iablonko, escreveu: “Perguntaram a Larissa, sua filha, se a mãe alguma vez se lembrava de Shultz [após sua morte]. Ela respondeu que Ilse o odiava. Tudo o que ela fez foi para salvar sua vida e a de suas irmãs”.
Coração no comando
Gueto de Minsk
Global Look PressMesmo que Stein apenas fingisse sentimentos pelo capitão, o amor deles era muito real para ele e teve grande impacto no capitão. “O amor dele por Ilse o mudou completamente”, diz um amigo de Stein, do gueto, sobre Schultz no documentário. “Ele se tornou uma pessoa diferente.” De fato, Shultz começou a sabotar o gueto – talvez, o único alemão em Minsk que estava ativamente tentando salvar os judeus.
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Certa vez, em julho de 1942, quando outro massacre eclodiu no gueto, Shultz protegeu Stein e todos os outros trabalhadores judeus sob seu comando, fechando-os no porão do prédio administrativo. No entanto, por meio de um dossiê, as autoridades alemãs ficaram sabendo que Shultz não era confiável: havia observações como “escutava secretamente a rádio de Moscou” e “avisou três judeus sobre um massacre em janeiro de 1943, salvando suas vidas”. A punição foi questão de tempo.
Dirigindo a fuga
“Atenção, aqueles que tentarem atravessar a cerca serão fuzilados”, lê-se em placa no gueto de Minsk
MAMM/MDF/russiainphotoTalvez Shultz não percebesse que estava em perigo, mas sabia que precisava salvar Stein – todos os judeus do gueto de Minsk estavam condenados à morte uma hora ou outra. Antes de deixar Minsk em 1944, os nazistas executariam todos na região. Shultz tentou então diferentes estratégias: obter passaportes falsos, passar pela frente com a ajuda de um colega da Luftwaffe – mas nada deu certo.
Havia ainda uma última chance: fugir para os partisans soviéticos. Liza Gudkevitch, uma judia local e amiga de Stein, tinha contatos em um dos grupos de partisans; junto com Shultz e alguns partisans, planejaram uma fuga ousada.
Em 30 de março de 1943, sob o pretexto de descarregar vagões, Shultz comandou um caminhão e uma equipe de 25 trabalhadores judeus, incluindo Stein e Gudkevitch. Quando saíram da cidade e se aproximaram da área sob controle de partisans, Shultz atirou no motorista e assumiu a direção. Os alemães abriram fogo, mas todas as 25 pessoas chegaram à segurança ao bosque.
Final sem sorte
Gueto de Minsk
MAMM/MDF/russiainphotoA história termina de maneira trágica, porém, pelo menos para Willi Shultz. Depois de passar meio ano com os partisans soviéticos, tornando-se oficialmente desertor, Shultz foi enviado para Moscou, onde as autoridades o separaram de Ilse, que estava grávida. Shultz morava em uma escola do NKVD (Ministério do Interior da URSS). perto da capital russa; algumas fontes mencionam que ele estava em treinamento para servir como agente disfarçado. Mas nunca chegou a ser um: em 31 de dezembro de 1944, o ex-capitão nazista morreu de meningite.
Stein continuou viva por mais quase 50 anos, falecendo em 1993. Seu bebê com Shultz morreu logo após nascer, mas ela seguiu em frente: aprendeu russo, casou-se e mudou para Rostov-no-Don, no sul da Rússia, onde teve filhos e netos.
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